sábado, abril 08, 2006

Mário de Andrade: nós temos que dar uma alma ao Brasil

Mário de Andrade por Lasar Segal


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Heitor Villa Lobos


Toda a minha obra é transitória e caduca, eu sei. E eu quero que ela seja transitória. Com a inteligência não pequena que Deus me deu e com os meus estudos, tenho a certeza de que eu poderia fazer uma obra mais ou menos duradoura. Mas que me importa a eternidade entre os homens da Terra e a celebridade? Mando-as à merda. Eu não amo o Brasil espiritualmente mais que a França ou a Conchinchina. Mas é no Brasil que me acontece viver e agora só no Brasil eu penso e por ele tudo sacrifiquei. A língua que escrevo, as ilusões que prezo, os modernismos que faço são pro Brasil. E isso nem sei se tem mérito porque me dá felicidade, que é a minha razão de ser da vida. Foi preciso coragem, confesso, porque as vaidades são muitas. Mas a gente tem a propriedade de substituir uma vaidade por outra. Foi o que eu fiz. A minha vaidade hoje é de ser transitório. Estralhaço a minha obra. Escrevo língua imbecil, penso ingênuo, só pra chamar a atenção dos mais fortes do que eu pra este monstro mole e indeciso ainda que é o Brasil. Os gênios nacionais não são de geração espontânea. Eles nascem porque um amontoado de sacrifícios humanos anteriores lhes preparou a altitude necessária de onde podem descortinar e revelar uma nação.


Mário de Andrade, "Carta a Drummond", S. Paulo, 10-XI-1924, in Carta aos Mineiros,
org. Eneida Maria de Souza e Paulo Schmidt, 1997.

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